Para se compreender o erro médico e o seu reflexo na responsabilidade civil médica e hospitalar, antes, é preciso analisar o significado e efeito de dever jurídico originário e dever jurídico sucessivo.
Para isso, tenha em mente que todo aquele que violar direito e causar dano a outrem comete ato ilícito (CC, art. 186). E, “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo (CC, art. 927)”. Aplicando essas regras ao erro médico, tem-se que toda pessoa tem o dever jurídico originário de não violar direito e nem causar dano, cuja violação gera um dever jurídico sucessivo ou responsabilidade civil, que é o de indenizar o prejuízo.
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É dever de o médico agir com diligência e zelo no exercício da sua profissão, esclarecer o seu paciente sobre sua doença, tratamentos e riscos possíveis, cuidados com o seu tratamento e aconselhar a ele e a seus familiares sobre as precauções essenciais requeridas pelo seu estado de saúde. O descumprimento de quaisquer desses deveres jurídicos originários é denominado de erro médico.
Logo, responsabilidade civil é atribuir ao médico ou hospital, após processo judicial regular, a obrigação de indenizar o paciente pelos danos causados. Essa obrigação indenizatória decorre da demonstração inequívoca do erro médico praticado mediante a violação de um dever jurídico de não causar danos a terceiros.
Nem todo fato ou ato médico e hospitalar alegado pelo paciente pode ser atribuído ao médico ou hospital, pois nem todo ato é considerado erro médico. Para se firmar que determinado ato é erro médico, o paciente deve levar ao judiciário uma causa que amolde à culpa do profissional liberal.
Dessa forma, erro médico é a conduta voluntária ou involuntária, direta ou indireta, praticada mediante imperícia, imprudência ou negligência, que cause dano ao paciente.
Não há dúvidas de que a responsabilidade civil do médico ou empresa médica é o dever obrigacional de indenizar, resultante da prática de erro médico e hospitalar. Todavia, para que se possa pleitear uma indenização por erro médico ao Estado-Juiz, o art. 186 do Código Civil de 2002, obriga ao paciente ou familiar demonstrar uma das modalidades de culpa do profissional de saúde – imperícia, imprudência ou negligência –, haja vista a teoria da responsabilidade civil subjetiva, calcada na culpa, adotada pelo o art. 186. Veja-se:
“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”(g.n).
Art. 186.
Código de Ética Médica também consagrou a responsabilidade subjetiva profissional (art. 1º), ou seja, o médico somente pode ser responsabilizado se provar a culpa, não podendo esta ser presumida. Veja-se a norma:
“Causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência.
Parágrafo único. A responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida”.
Art. 1º
Mas, não basta apenas demonstrar a culpa do médico, uma vez que sem o dano o ato ilícito praticado por culpa não assume relevância no campo da responsabilidade civil. Portanto, o reconhecimento do erro médico e da obrigação civil de reparar o dano pelo julgador esta consubstanciada também na demonstração do ato ilícito culposo, nexo de causalidade e dano, pressupostos da responsabilidade civil.
Cabe registar que com relação ao erro hospitalar, a responsabilidade civil do hospital é independentemente da existência de culpa, motivo pelo qual se exige apenas a demonstração da falha ou defeito na prestação do serviço hospitalar, o nexo de causalidade e o dano, por se aplicar, neste caso, a teoria da responsabilidade civil objetiva (Código de Defesa do Consumidor, art.14). Ipsis:
“O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.” (g.n).
Art. 14.
O reconhecimento pelo Estado-Juiz do erro médico e o dever de indenizar do médico depende da prova incontroversa da conduta ou ato ilícito do médico. No entanto, antes de levar o caso ao judiciário, o paciente deve individualizar os danos relacionados aos serviços técnico-profissional do médico daqueles que guardam relação com própria estrutura hospitalar, ou seja, aqueles que digam respeito à estadia do paciente (internação), instalações, equipamentos, serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia), administração de medicamentos.
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Individualizados os danos causados por falha na prestação dos serviços prestados pessoalmente pelo profissional médico, dispõe o art. 186 que o paciente deve indicar na petição inicial uma das modalidades de culpa, negligência, imprudência ou imperícia, pela qual o erro médico foi praticado.
Se há violação de um dever, existe tanto a imputabilidade do agente, como também a reprovabilidade da conduta, pois todo descumprimento de dever é censurável. Não pode haver culpa se há regularidade de conduta, se há cumprimento de dever.
No contexto do erro médico, a negligência médica pode ser entendida como a omissão no dever de cuidado, diligencia e zelo pelo médico, de modo que deixar de fazer algo quando podia e devia, atuando com total descaso de seus deveres éticos com o paciente. Age com negligência o médico que esquece material cirúrgico dentro do corpo do paciente.
Por outro lado, a imprudência, que configura erro médico, é a atuação açodada, contraria a prudência e precipitada do médico que, ciente do risco e ignorando a medicina, age assim mesmo. Dessa forma, age com imprudência o médico que autoriza alta prematura, ou realiza uma operação cesariana sem a equipe cirúrgica mínima necessária.
Por fim, a imperícia é caracterizada pela ausência ou deficiência de conhecimentos técnicos da profissão. Em resumo, é a ausência de conhecimento das normas, reduzido conhecimento técnico da profissão, o despreparo prático.
Para o reconhecimento da responsabilidade civil por erro médico é suficiente somente demonstrar a culpa médica? A resposta é negativa. Isso porque, sem o dano, conforme norma extraída do art. 186, o ato ilícito praticado por culpa não assume relevância no campo da responsabilidade civil.
A prática de um único ato ilícito médico ou hospitalar pode causar danos moral, material e físico (estético). O dano pode ser patrimonial ou material quando atingir o patrimônio financeiro do paciente; e extrapatrimonial ou moral atingindo a honra subjetiva, violando a esfera intima do paciente, causando abalo psicoemocional e violando componentes dos direitos personalíssimos do paciente, como à saúde, à integridade física, intimidade, privacidade e à imagem.
Ainda, o paciente pode ser vitima de um dano físico ou estético, causado erro médico em procedimento de cirurgia plástica estética. Essa exegese está prevista na Súmula 387 do Superior Tribunal de Justiça “É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral”.
O dano estético é a alteração morfológica interna e externa do paciente saudável antes da cirurgia, são as deformidades ou deformações estéticas, as quais causam desagrado e repulsa para o paciente e terceiros, após a cirurgia.
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A cirurgia estética ou cosmetológica é campo farto de exemplo de dano estético por erro médico. Exemplos mais comuns: cicatrizes hipertróficas localizadas nas mamas, queimaduras, deformação e assimetria dos seios decorrente de mamoplastia.
Impende registrar que a Constituição Federal de 1988 erigiu os direitos da personalidade a status de direitos e garantias fundamentais, bem assim, assegura o direito a indenização (art. 5º V e X), bem assim, o Código Civil (art. 11 e seguintes).
No plano infraconstitucional, a reparação desses danos tem amparo legal no art. 927 e seguintes do Código de Civil.
Por fim, para configurar o erro médico e consequentemente a responsabilidade civil do médico indenizar, exige-se a prova do nexo de causalidade entre o dano e o ato ilícito.
Entre o dano e o ato ilícito há um espaço que deve ser preenchido com a causa ou o ato médico, que se retirado faz desaparecer a responsabilidade civil.
Cada vez mais julgadores têm analisado o nexo de causalidade com fundamento no laudo pericial de perito médico oficial designado pelo juiz, em que pese este não estar vinculado a prova técnica. Isso se deve, uma vez que a matéria de erro médico exige conhecimento em medicina.
Na hipótese, um paciente admitido em hospital, submetido a exame de Raio-X, foi diagnóstico com embolia pulmonar e trombose, pelo profissional médico (01); mal estar e fadiga, pelo profissional médico (02); e cardimegalia com congestão pulmonar, insuficiência cardíaca congestiva, pelo profissional médico (03).
Tanto o diagnóstico de “mal estar, fadiga” afirmado pelo profissional médico (02), como o de “Insuficiência Cardíaca Congestiva” apontado pelo profissional médico (03), são contrários ao diagnóstico de “EMBOLIA E TROMBOSE DE OUTRAS VEIAS ESPECIFICADAS” firmado pelo profissional médico (01).
Pelas circunstâncias e sintomas do paciente, é clara também a responsabilidade dos profissionais médicos (02 e 03) pelo erro médico, sucessivo, causado por negligência e imprudência no erro de diagnóstico e ausência de encaminhamento do paciente para tratamento trombolítico, conforme protocolo de Trombo Venoso Profundo, Trombo Embolia Pulmonar ou embolia.
Dessa forma, verifica-se que todos os profissionais médicos praticaram erro médico, pois agiram com negligência e imprudência ao não encaminhar o paciente para internação e tratamento protocolar para o quadro embolia e cardíaco, uma vez que os exames e os sintomas exigiam obrigatoriamente essa conduta.
Por outro lado, é certo que o profissional médico (03), último que atendeu o paciente, agiu com imprudência ao autorizar alta médica, ao invés de internar o paciente debilitado em virtude das patologias apontadas nos exames, o qual faleceu dois dias depois.
Dessa forma, há nexo de causalidade, se restar demonstrado que a morte do paciente (dano), dois dias depois da alta e sem o tratamento, não ocorreria caso ele tivesse recebido o tratamento indicado para o diagnóstico, ao invés de ter recebido alta médica precoce, sem reavaliação (ato ilícito).
Portanto, o erro médico estará caracterizado pela presença do ato ilícito, nexo de causalidade e dano, fazendo surgir para o responsável causador a responsabilidade civil, consubstanciada na obrigação de indenizar o dano, seja moral, material ou físico.
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Galvão & Silva Advocacia
Artigo escrito por advogados especialistas do escritório Galvão & Silva Advocacia. Inscrita no CNPJ 22.889.244/0001-00 e Registro OAB/DF 2609/15. Conheça nossos autores.